Ministra da Injustiça

  • 30-03-2021

 

Em condições normais, este texto nunca seria escrito, pelo simples facto de que num País onde as responsabilidades políticas fossem levadas a sério, Francisca Van Dunem já não era ministra da Justiça há algum tempo. Para mal dos nossos pecados, ainda é.

 

Quando pensamos que já ouvimos tudo, eis que temos a titular da pasta da Justiça a fazer juízos de valor sobre casos concretos em investigação. Francisca Van Dunem desvalorizou a fraude com os processos de vacinação indevida, sublinhando que não será fácil fazer uma avaliação do ponto de vista criminal. Pior. Admitiu como razoável a vacinação indevida do “senhor da pastelaria” em caso de desperdício. Parece conversa de café, é um facto, mas são declarações de uma ministra que já que não consegue perceber qual o seu papel, deveria remeter-se ao silêncio para não atrapalhar a investigação. Felizmente, a Polícia Judiciária fingiu que não ouviu e continuou o seu trabalho. O Ministério Público também. 

 

Estranho que alguém com tamanhas responsabilidades não entenda o que está em causa nos processos de vacinação indevida. Francisca Van Dunem chega mesmo a dizer que “o país é relativamente pequeno e em certos extratos toda a gente se conhece e tende-se a conceder vantagens a pessoas relativamente próximas”. É verdade. Isso pode ser dito e desvalorizado por muita gente, menos pela ministra da Justiça. A verdade é que não podemos estranhar este comportamento. Francisca Van Dunem é a mesma pessoa que meteu os pés pelas mãos na trabalhada sobre a nomeação do procurador europeu, com um dano grave na imagem externa de Portugal. Aos olhos da governante, tudo não passou de uma falsa polémica. Coisa de detalhes. 

 

Assim passam os dias no reino da impunidade. Enquanto milhares de pessoas prioritárias continuam à espera da vacina, profissionais de saúde incluídos, uns quantos chicos-espertos arranjam um esquema para furar a fila. O país incomoda-se, a investigação arranca e a ministra da justiça desvaloriza. Ninguém acredita que este comportamento possa estar relacionado com a cor partidária de grande parte dos fura-filas. A verdade é que as palavras de Van Dunem abrem a porta a todo o tipo de interpretações e não ficam bem numa altura em que o País já percebeu que tem pela frente uma empreitada patriótica que não aceita esquemas, jeitinhos ou favorecimentos. Numa altura em que se exige o cumprimento da Lei, não dá jeito ter uma ministra da injustiça.