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10-09-2020
Pensar Saúde
10/SET | Dia Mundial da Prevenção do Suicídio
O Dia Mundial de Prevenção do Suicídio foi criado em 2003 pela Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) efetivando-se anualmente no dia 10 de setembro. Esta efeméride pretende sensibilizar as comunidades para a saúde mental através da divulgação de informação, combate ao estigma, reflexão da evitabilidade do suicídio e do papel de cada um de nós na sua prevenção.
A Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE) refere que o comportamento suicidário abrange todo e qualquer ato através do qual o indivíduo causa uma lesão a si próprio, independentemente do grau de intenção letal e conhecimento do verdadeiro motivo desse ato. Ideação suicida, tentativa de suicídio, parasuicídio e suicídio consumado são formas distintas de comportamentos suicidários [2].
O suicídio poderá ser excecionalmente o resultado de um processo de decisão em que a pessoa considerou que a morte seria a única solução, no entanto, na maior parte dos casos, o comportamento suicida está relacionado com a existência de doença do foro mental, que se diagnosticada e tratada atempadamente pode preveni-lo. Corroborando esta afirmação, Santos, et al., 2012, ressalva que as doenças mentais estão associadas a mais de 90% dos casos de suicídio.
O comportamento suicida constitui um problema de saúde pública com repercussões negativas no ambiente familiar e social da pessoa que se suicida, assim como, na comunidade, que enfrenta esta situação fatídica.
Perante esta problemática, emergiu o Plano Nacional de Prevenção do Suicídio 2013/2017, integrado no Programa Nacional para a Saúde Mental cujos valores e princípios assentam na acessibilidade e equidade, multiculturalidade e multidisciplinaridade, proximidade, sustentabilidade e intervenções científicas comprovadamente efetivas e que respeitem as boas práticas dos profissionais das áreas da saúde e social. A elaboração deste plano teve como objetivos a diminuição e o combate ao estigma, a uniformização da terminologia dos atos suicidas e a intervenção em grupos de risco como os jovens e os idosos.
Prevenir o suicídio deve incluir condições de atendimento e tratamento efetivo, assim como o controlo dos fatores de risco, a sensibilização e a informação adequada para uma maior perceção do risco de suicídio. “A sensibilização e informação da população constituem, numa perspetiva de saúde pública, um objetivo central para a prevenção do suicídio. A falta de conhecimento sobre causas e fatores de risco para o comportamento suicidário, opções de intervenção e tratamento, particularmente no âmbito da doença mental, podem limitar a procura de ajuda individual ou dos próximos” [3:32].
No Guia Orientador de Boas Práticas para a Prevenção de Sintomatologia Depressiva e Comportamentos da Esfera Suicidária, são identificadas as seguintes recomendações na prevenção do comportamento suicidário: a diminuição do acesso aos meios letais; a formação dos profissionais de cuidados de saúde primários; o aperfeiçoamento da ligação entre serviços de Saúde Comunitária e serviços de Saúde Mental; o desenvolvimento de uma equipa ampla para a prevenção do suicídio; a educação pública/comunitária, visando o combate ao estigma em torno da doença mental e comportamentos suicidários e formação dos media [3].
O problema do suicídio e a sua prevenção constitui um desafio importante da responsabilidade de todos os profissionais de saúde, ou seja, implica uma abordagem em equipa multidisciplinar, com estratégias e ações coordenadas entre todos. O Plano Nacional para a Prevenção do Suicídio 2013/2017, vai de encontro a esta afirmação, contemplando como uma das estratégias preventivas a identificação de parceiros de forma abrangente e multissectorial.
O enfermeiro especialista de Saúde Mental (EESM), como parte integrante de uma equipa multidisciplinar, detêm conhecimentos científicos, psicopedagógicos, relacionais e comunicacionais que lhe permite intervir de acordo com as necessidades da pessoa e sua família, de forma a prevenir o ato suicida.
Com vista a promover a qualidade do exercício profissional da enfermagem de saúde mental no âmbito desta problemática, o Guia Orientador de Boas Práticas para a Prevenção de Sintomatologia Depressiva e Comportamentos da Esfera Suicidária, enumera recomendações de boas práticas e procedimentos enfatizando a importância de resultados em saúde, permitindo a prevenção dos comportamentos suicidários, facilitando uma intervenção criteriosa e profissional baseada em evidência científica [3].
Na mesma fonte, são descritas as seguintes recomendações de cuidados de enfermagem à pessoa com comportamento suicidário: a valorização da perceção e comportamento do individuo; o estabelecimento de uma relação terapêutica com base numa relação interpessoal; a identificação de fatores de risco e de fatores de proteção; a avaliação do risco de suicídio; a avaliação do estado mental; adoção de estratégias de intervenção em crise; a promoção da esperança e comportamento de procura de ajuda; a identificação das pessoas afetadas pelo comportamento e intervenção sistémica; considerar as populações especiais, como os adolescentes e idosos e a garantia da continuidade de cuidados .
De salientar, a importância de uma abordagem centrada na pessoa, que implica incluir a pessoa no seu processo terapêutico, valorizando a sua história, facilitando o contato e o estabelecimento de uma relação baseada na confiança. Para tal, a atitude do profissional é essencial, demonstrando empatia, oferecendo escuta ativa e respeito pelo sofrimento e sentimentos da pessoa.
Existe ainda algum preconceito em abordar este tema, contudo, é importante dialogar direta e abertamente com a pessoa e família sobre ideação suicida, fatores de risco e fatores protetores, assim como, desmistificar mitos relacionados com esta temática. É imprescindível, o profissional estar sensibilizado para reconhecer a intenção de suicídio, mostrando disponibilidade para o diálogo, permitindo a expressão de pensamentos e emoções, sem juízos de valor.
A existência de tentativas de suicídio anteriores, a presença de doença mental, ter um plano estruturado de como efetivar o suicídio e dispor dos meios necessários para o fazer, o abuso de substâncias, a ausência de controlo de impulsos, a determinação em dar termo à vida, a desesperança, a falta de suporte social e/ou familiar, a baixa autoestima, o acesso a meios letais e a ausência de sentido e propósito de vida são fatores de risco importantes, que poderão implicar a necessidade de internamento. A compreensão destes fatores que predispõe e precipitam o comportamento suicidário permitem delinear e adequar as intervenções que diminuem o desespero e o sofrimento [3].
Reconhecer os fatores de proteção, também é importante, pois auxilia no reforço dos aspetos positivos que a pessoa dispõe. São considerados fatores de proteção: os recursos pessoais (autoestima, capacidade de resolução de problemas, estratégias de coping…); recursos familiares (apoio familiar, comunicação eficaz com a família e a vivência de relacionamentos estáveis e de confiança) e recursos sociais e comunitários (envolvimento em atividades desportivas e/ou de grupo, fácil acesso aos cuidados de saúde) [3].
A educação e informação à família, assim como à população em geral, não deve ser descurada, alertando-a para a identificação dos sinais de alerta e de medidas que possam tomar na prevenção do ato suicida.
Intervenções do âmbito psicoeducacional, psicoterapêutico e psicossocial são estratégias utilizadas pelo EESM que associadas à mobilização da família, amigos e recursos na comunidade garantindo a monitorização da pessoa enquanto persiste o risco de suicídio, são imprescindíveis na prevenção do suicídio.
Em suma, o comportamento suicidário está relacionado com fatores de risco e fatores protetores, à intencionalidade e letalidade do ato e a um extremo sofrimento emocional que não deve ser desvalorizado, pois é este que leva a que a pessoa atente contra a própria vida. Assim, é de vital importância uma apreciação/avaliação geral, da pessoa, demonstrando recetividade para a ouvir, empatia e autenticidade por parte da equipa multidisciplinar da qual faz parte o enfermeiro especialista de saúde mental.
Assim, são necessárias ações que visem: o aumento e a melhoria da informação e educação em saúde mental; a diminuição do estigma em torno da doença mental, ideação suicida e comportamentos autolesivos e/ou suicidários; o aumento dos níveis de bem-estar psicológico e a redução dos comportamentos autolesivos e atos suicidas [1].
Esta é uma situação real e muito séria, a pessoa com comportamento suicidário sente que não há esperança, contudo, esta combina uma enorme dor associada a um forte desejo de viver.
“(…)eu odeio a vida por amor a ela”
Fernando Pessoa
Vânia Parreira
Enfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica
Serviço de Psiquiatria do HSEIT
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Bibliografia
[1] Carvalho, Á. d., Peixoto, B., Saraiva, C. B., Sampaio, D., Amaro, F., Santos, J. C., Nazaré, S., DGS - “Plano Nacional de Prevenção do Suicídio 2013/2017”
[2] Ordem dos Enfermeiros (2018), “Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem”
[3] Santos, J. C., Façanha, J. D., Gonçalves, M. A., Erse, M. P., Cordeiro, R. A., & Façanha, R. M. (2012), “Guia Orientador de Boas Práticas para a Prevenção de Sintomatologia Depressiva e Comportamentos da Esfera Suicidária”
CER/BP/VP/rl