Obrigado Filhos!

  • 31-05-2020

Neste Dia Mundial da Criança, subjugados por uma pandemia, a SRSul dá voz aos filhos dos Enfermeiros que sofreram a dor maior – a separação física dos pais

 

“Somos filhos dos guerreiros das fardas brancas.

 

Daqueles que tiveram de nos deixar sem nos deixarem, em prol da defesa da vida humana que se viu atormentada por um vírus que se propagou e causou uma pandemia.

 

A farda branca que os nossos pais vestem é a dos Enfermeiros.

 

Repentinamente, sem qualquer aviso, passámos a vê-los e a ouvi-los à distância, com o coração apertado face ao medo de não mais os voltarmos a abraçar.

 

Ouvíamos dizer que os nossos pais eram uns heróis, contudo as suas vidas corriam perigo de morte, face à guerra que travavam com um inimigo invisível, que é causa da covid-19.

 

Escrevemos poemas, fizemos desenhos, inventámos músicas, escutámos canções, brincámos aos Enfermeiros na tentativa de apagarmos o tempo de espera que tinha aberto uma ferida nos nossos corações, mas a Saudade, essa teimava em estar presente em todos os momentos.

 

Lutávamos para ser iguais a tantas outras crianças, sem, no entanto, o ser. As outras tinham os pais para as abraçar, para brincar, para fazer inúmeras atividades durante o confinamento. A nós nunca nos foi dada essa oportunidade! Resta-nos a saudade e as recordações dos tempos FELIZES.

 

Foi difícil, ficamos confusos no meio de uma traição imposta pela vida que um filho paga pelo amor dos pais a uma profissão.

 

Porque teriam de ser os nossos pais considerados heróis, quando foram atirados para o mundo dos que clamavam por continuar a viver apesar de terem sido apanhados pela pandemia?

 

Também, nós queríamos continuar vivos com os nossos pais por perto, sem distâncias, sem ausências e sem reticências.

 

Quantas vezes nos sentimos desiludidos e ansiosos por vermos os nossos pais apenas pelos meios que a internet colocou ao nosso dispor.

 

Restava-nos a frase, vezes sem conta escrita e dita: “Vai ficar tudo bem”.

E, se não ficar?

 

Víamos os pais de tantos meninos irem para suas casas, tal como nós nos recolhemos, enquanto os nossos pais nos deixaram para nos protegerem.

 

Algo nos dizia que também os nossos pais tinham medo e não era suposto terem medo, pois, eles salvavam vidas.

 

Só poderiam ser verdadeiros heróis!

 

Mas não estavam sós. Também nós como filhos quando olhávamos ou falávamos com os nossos pais sem qualquer contacto físico lhes transmitíamos o amor que comungávamos com eles que precisavam continuar a ter coragem para lutar. Mas, a Saudade, essa continuava e teimava em não sair dos nossos pequenos corações, assim como o medo de não os voltar a ver.

 

Para os nossos pais, fomos e seremos sempre os seus heróis, aqueles que lhes dão força e alento para continuar a lutar para um futuro melhor para todos nós.

 

O sofrimento e o desalento acompanharam muitos dos nossos dias, enquanto eramos forçados a crescer injustamente por sermos filhos dos combatentes da linha da frente.

 

Teriam tido os nossos pais outra escolha?”

  

Ana Landeiro Ferreira