Margarida Tomás distinguida com Prémio de Investigação em Enfermagem Mariana Diniz de Sousa

  • 14-12-2023

Foram seis anos de trabalho que culminaram numa investigação agora reconhecida com uma das distinções mais importantes nesta área da enfermagem. Há uma década que que o Prémio de Investigação em Enfermagem Mariana Diniz de Sousa, da Secção Regional do Sul da Ordem dos Enfermeiros, dá relevo ao que melhor se faz em Portugal e 2023 não foi excepção. A investigação "O regresso à vida quotidiana após o primeiro internamento em psiquiatria: A experiência vivida", da Enfermeira Margarida Tomás, foi recentemente distinguida.

 

"Este prémio tem um significado muito especial porque representa o reconhecimento de um trabalho de seis anos desenvolvido no âmbito académico, mas que decorre daquilo que é o âmbito profissional do meu exercício enquanto Enfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica", começou por explicar.

 

"Durante aquilo que foi a minha prestação de cuidados no serviço de internamento de agudos, houve uma parte que sempre ficou oculta e para a qual eu partia de uma série de pressuposições. Este estudo permitiu-me conhecer um pouco mais aprofundadamente aquilo que são as vivências das pessoas, que depois de terem estado num internamento de psiquiatria pela primeira vez, regressam a casa e atravessam por uma série de adversidades e desafios, que colocam em causa o seu ser no mundo", acrescentou.

 

A oportunidade de poder mostrar a sua investigação no webinar na SRSul (pode ver ou rever no vídeo no final do texto) foi para Margarida Tomás uma oportunidade importante, mas receber o prémio… "Significa que é reconhecida qualidade e pertinência naquilo que é o panorama da investigação nacional e internacional", disse.

 

O sacrifício

 

Com a investigação a ser feita fora do horário de trabalho, a Enfermeira Margarida Tomás, de 45 anos, não hesita em dizer que "não foi fácil", mas rapidamente realçou o lado positivo da investigação.


"Implica uma conciliação entre a vida profissional e a vida familiar. Mas, sem dúvida, que os ganhos naquilo que é o desenvolvimento de nós próprios enquanto pessoas e enquanto profissionais, é elevado porque permite-nos ganhar uma sensibilidade perante aquilo que são as vivências do outro e compreender de facto aquilo pelo qual eles passam", referiu.


"Isto permite-nos compreender se há necessidade de estabelecer um outro tipo de cuidar a enfermagem que ainda não está clarificado no âmbito, neste caso, das políticas de saúde mental e compreender como a enfermagem pode dar resposta perante uma necessidade premente de uma atenção particular às pessoas que vivenciam esta transição. Nomeadamente aqueles que passam pela primeira vez por um serviço de psiquiatria e depois regressam a casa", reforçou.


"Este tipo de intervenções na enfermagem ainda não está claramente estipulado no acompanhamento à pessoa com perturbação mental e que é internada no serviço de psiquiatria e, de facto, deveria de ser estipulado de uma forma formal, um acompanhamento específico de redução gradual dos profissionais de saúde, quando estes utentes regressam a casa", concluiu.

 

A motivação

 

Apesar dos desafios que uma investigação como a que encetou acarreta, Margarida Tomás estava determinada a responder às questões a que se propôs.


"O primeiro aspecto está relacionado com o fenómeno em psiquiatria que é sobre a porta giratória. Ou seja, há uma percentagem significativa de utentes que tem internamentos repetidos. Questionei-me, ao longo da minha prática clínica, o que é que faz com que uns regressem e outros não. Este estudo tema particularidade de focar-se naqueles que, de algum modo, evidenciam uma capacidade de se manterem na comunidade", explicou.


"Questionei-me como é que estas pessoas voltariam de novo a reconectar-se com o mundo e não voltariam novamente ao internamento", acrescentou.
Para esta Enfermeira, esta "é uma parte que é oculta aos profissionais que estão no serviço de internamento", salientando que são estes quem "dão o grande primeiro apoio quando a pessoa está internada".


"A partir daqui temos de garantir que há uma continuidade de cuidados e que esta articulação é feita de uma forma fluida. Não sabendo eu como isto se processava – porque não tinha acesso às pessoas depois de elas terem alta – e verificando também o que tinha sido produzido em literatura até ao momento – em que não havia uma especificidade naquilo que eram os estudos qualitativos relativamente às pessoas que eram internadas apenas pela primeira vez –, toda a experiência era com as pessoas que tinham 10 internamentos versus as pessoas que tinham um internamento, portanto, os resultados não eram claros", referiu.


Considerou que era oportuno iniciar o seu estudo, contando com a orientação de professores, realçando o apoio da Professora Doutora Teresa Rebelo e da Professora Doutora Maria Leonor Xavier, que diz terem sido "fundamentais para o desenvolvimento deste trabalho". "Tive esta necessidade de estabelecer este olhar muito específico sobre as pessoas que vivenciam o internamento em psiquiatria não olhando de uma forma global, mas já peculiar para clarificar aquilo que acontece às pessoas pela primeira vez", frisou.

 

O futuro

 

Feita a investigação, há passos a seguir: "Agora há outro trabalho a fazer, de retirar daqui as conclusões e transformar isto numa intervenção que se adeque àquilo que foram as necessidades manifestadas pelos utentes."


Para que o estudo passa à prática, a Enfermeira Margarida Tomás referiu que "é através da disseminação juntos dos profissionais de saúde e de sensibilizá-los para a necessidade de um olhar particular sobre o fenómeno, que é o regresso à vida quotidiana após o primeiro internamento em psiquiatria."


E afirmou ainda: "Posteriormente, e também creio ter a minha responsabilidade, no desenvolvimento de intervenções e na sua investigação relativamente aos resultados produzidos e que estas intervenções têm de ser elas próprias alvo de uma investigação para que depois possam ser consideradas como parte da carteira que os serviços locais de saúde mental podem proporcionar aos seus utentes."

 

Conselho a jovens potenciais investigadores

 

Margarida Tomás recebeu o prémio na Cerimónia de Vinculação à Profissão, que contou com a presença de muitos jovens enfermeiros, agora a começar as suas carreiras. Alguns até pensam na investigação. O que lhes diria a Enfermeira para os incentivar?


"Diria que se estamos verdadeiramente comprometidos com a enfermagem, com aquilo que é o projecto existencial do outro, nós não podemos estar em enfermagem sem investigar. Seja uma investigação de grande envergadura – com implicação de outros parceiros e mais pessoas envolvidas na investigação –, seja algo mais restrito às equipas nos serviços, ou até a nível individual", afirmou.


"Só através da investigação é que nós demonstramos o verdadeiro comprometimento com o outro e com aquilo que a enfermagem advoga que é, no fundo, a manutenção e restauração da saúde e bem-estar e o ajudar o outro a lidar com aquilo que são as suas incapacidades, a vivência da doença, ou até a perspectiva da morte. Quando nós estagnamos e deixamos de ter uma curiosidade perante o mundo que nos rodeia e perante aquilo que é o mundo dos significados do outro, a quem nós temos o dever de ajudar, deixamos de corresponder àquilo que é o desígnio da enfermagem", concluiu.

 

Conheça as investigações candidatas ao Prémio de Investigação em Enfermagem Mariana Diniz de Sousa 2023

 

Em baixo pode assistir ao webinar da SRSul no qual foram apresentadas as investigações que estiveram a concurso, podendo conhecer ao pormenor o trabalho vencedor (a apresentação começa aos 29:30 minutos), decisão do júri constituído por:

  • Ermelinda Caldeira - Doutorada em Enfermagem. Enfermeira Especialista em Enfermagem Comunitária. Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem S. João de Deus da Universidade de Évora;
  • Florinda Galinha - Doutorada em Enfermagem. Enfermeira Especialista em Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica e em EMC Enfermagem à Pessoa em Situação Crítica. Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem de Lisboa;
  • Isa Félix - Doutorada em Enfermagem. Enfermeira Especialista em EMC Enfermagem à Pessoa em Situação Crónica. Professora Adjunta e investigadora na Egas Moniz School of Health & Science.