Morte triste

  • 30-10-2020

Não morrem por causa do SARSCoV2. Morrem por causa do “vírus” da solidão transmitido pelos familiares que deixam de os visitar com medo dos contágios. Os Enfermeiros que estão na linha da frente advertem: a dor da solidão de muitos idosos está a ser muito mais fatal do que a Covid-19. Estão a morrer por causa da doença, sem ter a doença. E avisam: “O afecto não infecta”. Os Enfermeiros dizem compreender o encerramento de serviços por causa dos contágios, mas não aceitam que se fechem os corações!

 

Neste sentido, os Enfermeiros da SRSul pedem, rogam, imploram, às famílias que arranjem estratégias para que se façam presentes junto dos seus familiares mais idosos que vivem sozinhos. O uso de máscara, a distância de dois metros, a limpeza das mãos, são métodos que evitam os contágios. Um olá, ao vivo, um sorriso, um acenar de afecto, uma palavra de carinho, são a vacina eficaz para as maiores vítimas não Covid desta pandemia. O afecto não infecta!

 

Os Enfermeiros, neste momento, em muitas situações, são a única visita, os únicos rostos, os únicos sorrisos que milhares de idosos recebem no dia a dia. Os Enfermeiros podem dar tudo, mas não o calor de um filho, de um neto, de um irmão… esse calor é insubstituível e a falta dele, por causa da Covid, está a levar à morte muitos idosos sem Covid. Morrem de tristeza…

 

Nesta fase da pandemia, com os números a acinzentarem o horizonte, e quando mais se apela ao isolamento, os Enfermeiros da SRSul pedem a todos para que não isolem os idosos. Porque a dor da solidão, o frio do abandono, está a ser mais fatal do que o SARSCov2.

 

A SRSul manifesta todo o seu apreço às instituições de acolhimento, nomeadamente as que gerem Estruturas Residenciais para Idosos, que, ao invés de pura e simplesmente proibir as visitas, têm criado estratégias para que os seus residentes possam continuar a contactar os seus familiares de forma segura, sem risco para os próprios nem para quem lá trabalha. A SRSul reitera que  “o afecto não infecta…”

 

Estatísticas

Entretanto, o Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgou  dados a confirmar o alerta dos Enfermeiros da SRSul sobre o aumento do número de idosos mortos sem Covid, mas por causa da Covid.

O INE informou esta sexta-feira, 30 de Outubro de 2020, que “as mortes por Covid-19 em Portugal entre 2 de Março e 18 de Outubro representam apenas 27,5% do acréscimo da mortalidade registado relativamente à média dos últimos cinco anos”.

 

Ou seja, diz o INE, “o acréscimo da mortalidade, verificado a partir de Março, relativamente à média dos últimos cinco anos, é explicado apenas em parte pelos óbitos por Covid-19”. Analisando os números do ponto de vista etário, mais de 70% das mortes (51.641) foram de pessoas com idade igual ou superior a 75 anos, com 6.824 óbitos a mais nesta faixa etária em relação à média de óbitos observada no período homólogo de 2015-2019. Entre estas mortes, 5.377 foram de indivíduos com pelo menos 85 anos.

 

Sublinhando, registaram-se 6.824 óbitos a mais, entre pessoas com idade igual ou superior a 75 anos, nestes últimos oito meses comparativamente ao período homólogo nos últimos cinco anos.

 

Já em termos de género, as 72.519 mortes registadas no total entre 2 de Março e 18 de Outubro, distribuem-se por 36.069 mulheres e 35.482 homens, ou seja, mais 4.608 e 3.328, respetivamente do que a média de óbitos no mesmo período dos últimos cinco anos.

 

A SRSul desconhecia estes dados oficiais quando lançou o alerta para a necessidade de todos estarmos mais atentos aos idosos, sobretudo aos que vivem sozinhos.  Olhando agora para os números do INE, que atestam o que os Enfermeiros constatam todos os dias, a SRSul reitera o seu apelo: “Os afectos não infectam”. Mesmo com as restrições indicadas pela Direcção-Geral da Saúde (DGS) – uso de máscara, distanciamento de um ou dois metros, lavagem das mãos -, é possível manter vivos os afectos e as vidas.