Recomendações sobre dotações de enfermeiros serão aplicáveis a todas as unidades de saúde

Lisboa, 22 de Outubro de 2011 - A falta de enfermeiros nos serviços de saúde pode traduzir-se, em termos práticos, em que em vez de cinco dias, uma úlcera de pressão implique 25 dias de internamento. Da mesma forma, o custo do seu tratamento pode passar de mil euros para 25 mil euros, o que corresponde aproximadamente ao custo de 25 meses de salário de um enfermeiro recém-licenciado. Para fazer frente à carência de enfermeiros e consequentes custos para os doentes e para o sistema de saúde, a Ordem dos Enfermeiros (OE) vai transformar o documento de consenso sobre dotações em regulamento, responsabilizando as direcções das unidades de saúde públicas, privadas e do sector social pelo incumprimento dos valores de referência. A dotação de enfermeiros nos vários serviços de saúde e as consequências da carência desses profissionais foi um dos temas que esteve em destaque na IV Conferência do Conselho de Enfermagem, um evento que decorreu ontem e hoje na Reitoria da Universidade Nova de Lisboa.

De acordo com o Enf.º Jacinto Oliveira, Vice-presidente do Conselho Directivo da OE e membro do grupo de trabalho conjunto que elaborou o «Guia de Recomendações para o cálculo da dotação de enfermeiros no Serviço Nacional de Saúde - Indicadores e valores de referência», este documento de consenso, que se efectivou com a equipa ministerial anterior, está a ser analisado pelos actuais responsáveis pela «pasta» da Saúde. E em seu entender, «a crise não invalida a implementação» de um despacho da Dr.ª Ana Jorge que prevê que, até 2015, as fórmulas definidas para o cálculo de dotações devem ser aplicadas faseadamente.

Mas independentemente do que o actual Governo decidir, «a OE vai transformar aquele guia em regulamento aplicável a todas as organizações». Com esta medida pretende-se que as recomendações nele presente sejam respeitadas pelas unidades de saúde do sector público, privado e social. Recorde-se que, por exemplo, o documento estabelece que ao nível dos cuidados hospitalares, os serviços de Medicina devem ter enfermeiros em número suficiente para assegurar 6.33 horas de cuidados. Ao nível dos Cuidados de Saúde Primários, a cada enfermeiro devem corresponder 300 a 400 famílias e, no caso das Unidades de Cuidados na Comunidade, o rácio deve ser de 1 enfermeiro para 4 mil habitantes.

O não cumprimento dessas recomendações podem permitir a responsabilização dos dirigentes das unidades – onde se incluem os enfermeiros com cargos de chefias.

Ainda segundo o mesmo prelector, o investimento feito na contratação de mais enfermeiros pode ser compensado com a redução de custos inerentes a «erros de medicação, infecções hospitalares, quedas e úlceras de pressão», salientou.

Segundo o Enf.º António Marques, outro dos elementos da OE no grupo de trabalho conjunto para as dotações, «reduzir o número de enfermeiros é sempre uma decisão economicista». Isto porque «o valor dos cuidados de Enfermagem não deverá traduzir-se apenas em custos, mas também na qualidade» que esses cuidados implicam, em especial ao nível da «satisfação do cliente e ganhos em saúde», como acontece, por exemplo, nas acções de educação para a saúde em doentes crónicos ou no caso das úlceras de pressão acima mencionado.

O Modelo de Desenvolvimento Profissional (MDP) – que assenta na criação de um período de prática profissional tuteladas para recém-licenciados em Enfermagem e para enfermeiros que querem especializar-se numa das actuais seis especialidades de Enfermagem – foi outro tema-chave deste encontro. De acordo com a Enf.ª Teresa Oliveira Marçal, Vice-presidente do Conselho Directivo da Ordem dos Enfermeiros, na última reunião que a OE teve com o Dr. Manuel Teixeira, Secretário de Estado da Saúde, o Ministério assegurou que o MDP deve ser regulamentado e implementado, sendo que o projecto de diploma formulado pela equipa ministerial anterior será o ponto de partida para o actual trabalho.

Na sua intervenção na sessão de abertura da IV Conferência do Conselho de Enfermagem, a Enf.ª Maria Augusta Sousa; Bastonária da OE, alertou para as mudanças que estão em curso ao nível nacional e internacional. «O modelo de saúde, tal como o conhecemos, já está abalado», pelo que, nunca como antes «é preciso ancorar a profissão numa visão de longo prazo», mais ampla – que vá além da própria Enfermagem. Só assim se poderá responder ao presente e ao futuro e garantir «um contributo essencial para a defesa dos direitos dos cidadãos».

A presença de enfermeiros na emergência pré-hospitalar e a sua participação em projectos nacionais e internacionais ligados à alcoologia e à Enfermagem de Família foram outros dos temas em debate num evento que reuniu em Lisboa cerca de 250 enfermeiros. A estes assuntos acrescem os Padrões de Qualidade para os Cuidados de Enfermagem, o trabalho desenvolvido pelo Conselho de Enfermagem nacional e pelos Conselhos de Enfermagem Regionais, programas formativos das especialidades, atribuição de títulos profissionais e a estrutura de idoneidades.

 

GCI/LCN