Artigo de opinião do Bastonário da OE à HealthNews

  • 11-04-2024

 Há décadas que o SNS discute formas de melhorar o acesso e a prestação de cuidados de saúde. Já perdemos muito tempo com diagnósticos e debates intermináveis.

 

O país dos debates, dos discursos, dos artigos de opinião, todos brilhantes e oportunos, das grandes intenções nunca concretizadas e das medidas estruturais sem qualquer efeito prático, tem de acabar. Antes que seja tarde.

Precisamos ser muito claros e consequentes: o modelo assistencial centrado nos hospitais está ultrapassado.

Os relatórios e estudos nacionais e internacionais há muito que apontam para a necessidade de um reforço efetivo dos cuidados de proximidade na comunidade.

 

Acresce que os sistemas de saúde que se centram no diagnóstico e tratamento da doença e ignoram a prevenção e a promoção da saúde estão, igualmente, obsoletos.

 

Portugal é um dos países mais envelhecidos do mundo. Um em cada três portugueses terá mais de 65 anos em 2050, e, um em cada oito, mais de 80. Precisamos preparar-nos para este inverno demográfico.

 

O envelhecimento da população e o aumento de doenças crónicas e, consequentemente, um maior grau de dependência das pessoas exige que se invista com prioridade nos cuidados de proximidade, onde os enfermeiros devem assumir plenamente a gestão da doença crónica.

 

É preciso dotar de meios os cuidados de saúde primários, os cuidados continuados e as Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas.

 

É preciso que os cuidados no domicílio sejam uma realidade generalizada, como já acontece noutros países. Por exemplo, na Suécia, os enfermeiros chegam a deslocar-se a um domicílio oito vezes por dia.

 

É preciso garantir que nas ERPI os cuidados de saúde sejam prestados por enfermeiros e que estes existem em número suficiente. Cuidar dos idosos é um dos nossos grandes desafios. Hoje são os nossos pais e avós, amanhã seremos nós.

 

E neste mundo novo, onde se exige uma mudança de mentalidades, não podemos ficar para trás.

 

A prescrição por Enfermeiros continua a ser um tema tabu em Portugal. O número de países onde é permitida a prescrição farmacológica por Enfermeiros tem vindo a aumentar. Não podemos ignorar esta realidade, sobretudo, quando é mais uma forma de garantir um acesso em tempo útil a cuidados de saúde. A prescrição por enfermeiros será uma realidade inevitável no futuro. Não avançar por este caminho apenas nos fará perder tempo.

 

Por outro lado, o país tem assistido nos últimos anos a uma crise na acessibilidade aos cuidados de saúde materna, que não é compatível com a manutenção dos entraves ao exercício das competências dos enfermeiros especialistas em enfermagem de saúde materna e obstétrica.

 

A Ordem dos Enfermeiros defende, há algum tempo, a criação de centros de parto normal, uma solução fácil de implementar, com ganhos em saúde e otimização de recursos e que permitiria resolver uma parte substancial dos fortes constrangimentos que se verificam neste setor.

 

Recentemente, uma orientação da DGS formalizou o internamento hospitalar de grávidas de baixo risco em trabalho de parto por enfermeiros especialistas de saúde materna e obstétrica. O caminho tem de ser este.

 

Porém, é importante não esquecer que mais competências implicam maior responsabilidade e uma maior responsabilidade, implica, por sua vez, uma maior valorização.

 

Não podemos ter medo de associar a qualidade e segurança da prestação de cuidados de saúde à valorização dos profissionais.

Aliás, vejo com frequência, grandes ideias e projetos, que apelam à liderança e dinamismo dos enfermeiros, mas partem do pressuposto de que estão devidamente motivados. E jamais haverá motivação sem valorização.

 

Qualquer reforma, plano ou medida estrutural na saúde, que não comece por três questões essenciais: salário, carreira e condições de trabalho dos enfermeiros estará condenado ao fracasso.

 

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