OE «desmonta» números da Mercer e repudia intenção governamental de nivelar vencimentos desde já desprestigiantes

OE «desmonta» números da Mercer e repudia intenção governamental de nivelar vencimentos desde já desprestigiantes

A Ordem dos Enfermeiros (OE) tomou conhecimento, através da comunicação social, de um alegado estudo comparativo sobre salários nos setores público e privado, concebido pela Consultora Mercer. De uma forma genérica, e no que diz respeito ao setor da Saúde, o estudo concluiu que os enfermeiros do setor público auferem um salário médio bruto de 1.360€ (1.625€ com suplementos), um valor superior aos colegas do setor privado.

Como é sabido, a média é um elemento matemático relativo e muito pouco rigoroso.

Além disso, e dando cumprimento ao seu desígnio de zelar pela dignidade e prestígio da profissão, a OE vem, por esta via, apresentar o cabal esclarecimento sobre esta questão e recordar o poder político que muitos dos enfermeiros não estão a auferir os 1.200€ definidos por lei. Para a OE, trata-se de fazer justiça com todos aqueles que colocam o seu conhecimento e profissionalismo ao serviço dos cidadãos – apesar de considerar que o valor não traduz a diferenciação, responsabilidade e o impacto dos cuidados no sistema.
  
As conclusões apresentadas pela Mercer – tal como as que foram divulgadas pelos vários meios de comunicação social – induzem na opinião pública conceções erróneas e despropositadas acerca do enquadramento salarial dos enfermeiros em Portugal, pelo que a Ordem dos Enfermeiros rejeita esta forma linear e não sustentada de análise – bem como qualquer decisão política que nela se fundamente.

Desmontemos então os números avançados, sendo que a Ordem dos Enfermeiros apresenta sérias dúvidas relativamente à recolha dos dados. Desde logo é afirmado pela Mercer que no setor público foram considerados os salários dos enfermeiros e enfermeiros principais. Todavia, esta última categoria ainda não é detida por nenhum enfermeiro, uma vez que a reestruturação da carreira é recente. Também não foram apreciados os vários cortes salariais que os enfermeiros têm sido alvo, tal como a recente redução dos suplementos salariais (decorrentes das horas de qualidade: noites, fins-de-semana e feriados) ou as várias taxas tributárias a que agora estão sujeitos.

No que concerne ao setor privado, a Ordem dos Enfermeiros mantém as suas reservas, uma vez que as condições são muito discrepantes – com variações substanciais entre instituições, antiguidade ou experiência profissional ou cargos desempenhados. Consequentemente, tal situação é propícia a enviesamentos. Assim sendo, o uso da média como fator comparativo não reflete a realidade das conclusões. De sublinhar que os dados referentes ao setor privado não foram recolhidos diretamente pela consultora, mas fornecidos pelo Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério da Solidariedade e Segurança Social.

No entanto, pesando todos os factos, se recorrêssemos à informação apresentada pelo estudo em questão poderíamos deduzir uma conclusão: os enfermeiros constituem-se como a classe profissional de nível académico superior com as piores retribuições da Administração Pública. Comparativamente com outras classes profissionais que requerem uma formação académica ao nível da licenciatura, os enfermeiros auferem menos 640€ que os educadores de infância e docentes do Ensino Básico e Secundário, 1.790€ que médicos, 440€ que os engenheiros, 725€ que os técnicos informáticos e menos 495€ que os técnicos superiores. Tal consubstancia a mais profunda injustiça e reflete a falta de reconhecimento de sucessivos governos para com uma classe que é considerada como «o pilar do sistema de saúde».

E essa injustiça mantém-se mesmo quando a comparação é estabelecida entre o salário mensal médio bruto dos enfermeiros (que inclui os suplementos salariais) e o salário-base de outras classes profissionais.
 
A Ordem dos Enfermeiros lamenta a errada visão estratégica dos gestores da Saúde que consideram os enfermeiros como um custo e não um investimento com rentabilidade e elevados ganhos.

Prevendo as alegadas intenções do Governo em nivelar o enquadramento salarial da Administração Pública de acordo com as suas conveniências, a Ordem dos Enfermeiros, na observância de um dos seus principais desígnios, patente no Art.º 3 do Estatuto da OE – “zelar pela função social, dignidade e prestígio da profissão de enfermeiro, promovendo a valorização profissional e científica dos seus membros”, relembra que a retribuição dos enfermeiros já é balizada pelo mínimo que o ordenamento jurídico português impõe para os licenciados. Repudia-se, igualmente, esta política de absoluto desinvestimento naqueles que produzem mais riqueza e contribuem para o bom desenvolvimento da sociedade e da economia, em consonância com os princípios e valores que caracterizam a vida humana, pondo em causa a valorização social, política e profissional de todos os enfermeiros.

Enf. Germano Couto
Bastonário da Ordem dos Enfermeiros

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