Dia Nacional do Doente com Acidente Vascular Cerebral - Relembrar o dia 31 de Março é trazer para a memória as pessoa que sofreram de um AVC - Texto da Comissão de Especialidade de Enfermagem de Reabilitação

Dia Nacional do Doente com Acidente Vascular Cerebral - Relembrar o dia 31 de Março é trazer para a memória as pessoa que sofreram de um AVC - Texto da Comissão de Especialidade de Enfermagem de Reabilitação

As pessoas vítimas de AVC (acidente vascular cerebral), sobretudo as portadoras de hemiplégia, apresentam deficiências e incapacidades que provocam com frequência mudanças complexas nas relações com aqueles que lhes são mais próximos e algumas delas também observáveis no relacionamento com a comunidade em geral (1). A paralisia ou parésia de um dos lados do corpo e a consequente perda das capacidades motoras, sensitivas e funcionais, mas também as alterações da compreensão, da linguagem, e os distúrbios emocionais são os responsáveis pela alteração dessas relações.

Para além da extrema dependência de outros podem encontrar-se indivíduos com elevados níveis de ansiedade, impaciência, irritabilidade, agressividade, rigidez do pensamento e sintomas depressivos (2) que representam um rol significativo de dificuldades para aqueles que lhes estão próximos.

O AVC é uma das causas mais importantes de hospitalização, mortalidade e incapacidade. Afecta em média três pessoas por hora, 54 por dia e cerca de 20 mil pessoas por ano 3. Nos países desenvolvidos é a terceira causa de morte e a primeira causa de incapacidade crónica. Em Portugal é a primeira causa de morte e uma causa importante de internamento hospitalar 4 e incapacidade permanente.


Esta patologia pode definir-se como uma doença neurológica de início súbito que se prolonga por 24 ou mais horas. Refere-se a um complexo de sintomas e de alterações neurológicas, que são a expressão de lesões cerebrais provocadas por alterações da irrigação sanguínea.

Quando o acidente vascular ocorre de uma forma transitória e os sinais neurológicos estão presentes durante um curto espaço de tempo designa-se por Acidente Isquémico Transitório (AIT) ou défice neurológico reversível. Embora o AIT seja um episódio breve com remissão completa dos défices neurológicos, os acidentes isquémicos desta natureza são um sinal de aviso de um problema maior eminente já que do total de doentes com AIT 25 a 51% vêm a ter um acidente vascular no prazo de cinco anos 5.

As alterações da perfusão cerebral resultam da trombose de uma artéria, de lacunas, de embolia, hematoma intracraneano, hemorragia subaracnoideia e aneurisma ou malformações arteriovenosas.

Apesar de existir alguma heterogeneidade nos mecanismos que conduzem a esta doença, podem distinguir-se dois tipos: o AVC Isquémico e o AVC hemorrágico: cerca de 15% têm origem hemorrágica e dos 85% de AVCs isquémicos 6.

A idade é um factor importante quando se trata desta doença, mas são também factores de risco a hipertensão, especialmente em associação com a aterosclerose, a presença de doença cardíaca e de diabetes. Outros factores de risco importantes são o tabagismo, o uso de contraceptivos orais (especialmente se associado ao tabaco), o excesso de ingestão de bebidas alcoólicas, antecedentes familiares de acidente isquémico transitório, ou acidente vascular cerebral.

Do suprimento sanguíneo ou da hemorragia em determinada área do cérebro resulta a isquémia e a consequente morte das células cerebrais com comprometimento das funções cerebrais. As alterações neurológicas consequentes a este processo irão traduzir-se em défices a nível das funções motoras, sensoriais, comportamentais, perceptivas e da linguagem.
 
Os estudos revelam que, no nosso país 7 a maioria das pessoas com compromisso físico é cuidada em casa pela família. Por isso, falar da pessoa com AVC é falar do binómio doente - familiar cuidador. Para estes, o conhecimento sobre a situação ou a incapacidade são fundamentais para o funcionamento eficaz tanto dos doentes como dos membros da família.

Cabe aos enfermeiros orientar os doentes e estimulá-los a realizar os exercícios em casa, bem como aconselhar quanto aos cuidados a ter relativamente à pele, bexiga e intestinos e ajudar na escolha e utilização de dispositivos e aparelhos de que necessitem. Cabe-lhes ainda informar, apoiar e orientar a família e outras pessoas envolvidas na prestação de cuidados 8. No ensino, tanto do doente como da família reside o desafio dos cuidados de Enfermagem e de uma forma particular dos cuidados de Enfermagem de reabilitação.

Devem ser aproveitadas todas as oportunidades para incentivar e ensinar a família a participar nos cuidados ao doente, de acordo com as suas possibilidades.

É fundamental o ensino sobre a necessidade de alterar a posição de horizontal para vertical, encorajando o levante, elevando a cabeceira ou sentando o doente, em função do nível de dependência e capacidade do familiar de referência; o ensino sobre as transferências, sobre a necessidade de alterar decúbitos e tempo de permanência em cada um deles em função do grau de mobilidade do doente; sobre a necessidade de manter e de incentivar posições correctas e alinhamento corporal; os autocuidados de higiene e conforto bem como de estratégias que os facilitem; o ensino sobre os cuidados à pele e sinais de alerta de úlceras de pressão e de como intervir face a esses sinais.

Além disso, devem também ser referidas questões como: a necessidade de evitar temperaturas extremas e sobre os cuidados a ter com a alimentação, relacionados com a diminuição dos reflexos de deglutição e com a necessidade de nutrição e hidratação adequadas; o acto de vestir e despir o doente e a necessidade de incentivar o controlo da micção, alertando para os cuidados a ter se incontinência ou obstipação; os défices de linguagem e estratégias de comunicação eficaz 9,  sobre a necessidade de adequar o espaço físico às necessidades do doente e do familiar e esclarecimento sobre os recursos sociais e da comunidade, incluindo o subsídio de pessoa a cargo.

O doente deve ser encorajado a receber visitas e não se isolar a sentar-se na varanda ou no jardim e a passear na rua quando tal for possível. Apesar da sua incapacidade, deve ser tratado com respeito e dignidade e ser integrado nos assuntos da família. 10

Relativamente à recuperação funcional, a terapêutica pelo movimento deve iniciar-se logo que o doente esteja estável do ponto de vista médico e tem como objectivos minimizar as anomalias do tónus, manter a amplitude dos movimentos, melhorar as funções respiratória e circulatória, treinar as pessoas nas actividades funcionais como a mobilidade na cama, sentar, pôr em pé e transferências, prevenir os problemas relacionados com a falta de uso, promover a consciência do lado hemiplégico, melhorar o controlo do tronco, do equilíbrio sentado e em pé e maximizar as actividades de autocuidado.

Para além do descrito é igualmente importante o apoio na tomada de decisões tanto do doente como da família.

A importância do ensino não se esgota na promoção da independência funcional do doente. Também desempenha um papel fundamental na prevenção de reinternamentos, sobretudo quando se trata de pessoas, idosas verificando-se mesmo uma relação significativa entre as hospitalizações e a redução das capacidades funcionais 11. Daí que seja importante não esquecer que, uma vez no domicílio, a pessoa com AVC e o familiar de referência ou cuidador principal continuam a necessitar de orientação e visitas periódicas tanto dos enfermeiros como médico.   

Comissão de Especialidade de Enfermagem de Reabilitação - Enf.as Ângela Prior, Eugénia Grilo, Eugénia Mendes, Margarida Matos e Maria José Carinhas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1 OLIVEIRA, Aragão Rui (2000) – Elementos psicoterapêuticos na reabilitação dos sujeitos com incapacidades físicas adquiridas. [Em linha], Análise Psicológica, 4, XVIII, pp.437-453. URL www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/aps/ v18n4/v18n4a02.pdf [cons.03.07.2007].

2 A OLIVEIRA, Aragão Rui (2000) – Elementos psicoterapêuticos na reabilitação dos sujeitos com incapacidades físicas adquiridas. [Em linha], Análise Psicológica, 4, XVIII, pp.437-453. URL www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/aps/ v18n4/v18n4a02.pdf [cons.03.07.2007].

3 CARDOSO, Teresa; FONCECA, Teresa; COSTA, Manuela (2003) – Acidente Vascular Cerebral no Adulto Jovem. [Em linha] Acta médica, 16, pp. 239-244. www.ordemdosmedicos.pt/ie/institucional/publicacoes/acta4-2003/239a244.pdf [cons. em 30.07.2006].

4 PEREIRA, Sofia et al. (2004) – Acidente Vascular Cerebral Hospitalização, Mortalidade e Prognóstico. [Em linha] Acta médica, 2004,17, pp.182-192. www.ordemdosmedicos.pt/ie/institucional/publicações/acta3-2004/187-192%20ACIDENTE%20VASCULAR%20CEREBRAL.pdf [cons em 30.07.2006].

5 CALDAS, Castro Alexandre (1986) – «Síndromes neurológicas de causa vascular» in ANTUNES João Lobo e FERRO José M.: Acidentes Vasculares Cerebrais: diagnóstico e tratamento. Lisboa, Edição dos autores.

 6 CALDAS, Castro Alexandre (1986) – «Síndromes neurológicas de causa vascular» in ANTUNES João Lobo e FERRO José M.: Acidentes Vasculares Cerebrais: diagnóstico e tratamento. Lisboa, Edição dos autores.

7  TORRES, Anália et al. (2004) – Homens e Mulheres entre Família e Trabalho. Estudos, 1, Lisboa., CITE.


8  DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE (2000) Viver Após Um Acidente Vascular Cerebral, Guias Para As Pessoas Idosas: Autocuidados Na Saúde E Na Doença (2) Lisboa.

9 HOEMAN P. Shirley, (2000) – «Bases Conceptuais da Enfermagem de Reabilitação» in HOEMAN P. Shirley: Enfermagem de Reabilitação – Aplicação e Processo. 2º ed., Loures, Lusociência.

10  DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE (2000) Viver Após Um Acidente Vascular Cerebral, Guias Para As Pessoas Idosas: Autocuidados Na Saúde E Na Doença (2) Lisboa. 

11 RADWANSKI B. Maria, e HOEMAN P. Shirley (2000) – «Enfermagem de reabilitação geriátrica» in HOEMAN P. Shirley: Enfermagem de Reabilitação: Aplicação e Processo. 2º ed, Loures, Lusociência.

31 de Março de 2009

 

 Divulgado no Espaço Cidadão a 21.05.2009 

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