Carta aberta: 35 Horas - uma questão de saúde pública

Carta aberta: 35 Horas - uma questão de saúde pública

Exmo. Sr. Ministro das Finanças,

Professor Doutor Mário Centeno,

Escrevo-lhe por um imperativo de consciência e porque sei que a última palavra, ou pelo menos a penúltima, é sua. O dossier das 35 horas na enfermagem não é uma questão laboral, mas de saúde pública.

V. Exa. é ministro num país que tem permitido, por exemplo, que apenas três enfermeiros cuidem de 40 doentes num serviço de urgência. O mesmo país que aceita que um enfermeiro, sozinho, cuide de 55 doentes. 

V. Exa. é ministro de um país onde existem serviços de saúde com metade dos enfermeiros de baixa, esgotados. O mesmo país que tolera que seis enfermeiros respondam perante um universo de 40 mil utentes inscritos num centro de saúde.

Não são números, são vidas. As nossas e as daqueles de quem gostamos.

Os enfermeiros não aguentam continuar a carregar, com o seu profissionalismo, voluntarismo e enorme esforço físico e mental, um sistema que deixa degradar a qualidade dos serviços prestados.

Os enfermeiros não querem trabalhar menos, querem trabalhar melhor. A redução para as 35 horas semanais não é uma exigência laboral, é um pedido de socorro de um sistema que chegou ao limite. Pelos doentes. Pela saúde de todos. Não pode haver enfermeiros de primeira e enfermeiros de segunda: uns a trabalharem 35 horas e outros 40. Não é o tipo de contrato que define um enfermeiro.

Senhor ministro, quanto vale uma vida? Quanto custa cuidar de uma vida? Estas serão, certamente, as contas mais difíceis de fazer ao longo do seu mandato. Convido-o, por isso, a visitar comigo e com a equipa da Ordem dos Enfermeiros, vários serviços de saúde, de norte a sul e regiões autónomas. Estou certa de que isso lhe facilitará o exercício de somar e subtrair.

O senhor primeiro-ministro garantiu que as 35 horas são para todos. V.Exa. explicou que não é bem assim. O ministro da Saúde afirmou que 2.000 enfermeiros seriam contratados para fazer face à redução para as 35 horas. Não chega. Ainda assim, o PS explicou que, afinal, o concurso que foi aberto pelo anterior governo é suficiente, esquecendo-se, ou não, que estamos a falar de 1.000 enfermeiros para colmatar necessidades já existentes nos centros de saúde, o que ainda assim seria insuficiente. Esta questão nada tem a ver com as 35 horas. Que fique claro. 

O que hoje é verdade, amanhã é quase verdade, mas pode ser tarde demais. Recuar perante um compromisso, neste caso, é lançar o SNS no caos. Os enfermeiros estão exaustos: precisam todos das 35 horas. O sistema de saúde está por um fio: é urgente contratar mais enfermeiros e não apenas para ajustar a redução do horário semanal.

Termino reafirmando o convite que lhe fiz e peço-lhe que assuma publicamente o compromisso de não bloquear a contratação dos enfermeiros de que o país precisa. Pela saúde de todos.

Creia-me, senhor ministro, com elevada estima e consideração.


A BASTONÁRIA DA ORDEM DOS ENFERMEIROS

ANA RITA PEDROSO CAVACO




Subscrevem:


Vice-presidentes OE
Luís Barreira
Graça Silveira Machado

Presidente da Secção Regional da Região Autónoma dos Açores
Luís Furtado

Presidente da Secção Regional do Centro
Ricardo Correia de Matos

Presidente da Secção Regional da Região Autónoma da Madeira
Élvio Jesus

Presidente da Secção Regional do Norte
João Paulo Carvalho

Presidente da Secção Regional do Sul
Sérgio Branco
 

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