Ajudar enfermeiros a prevenir stress no trabalho

  • 20-08-2018

O Projecto INT-SO: Dos contextos de trabalho à saúde ocupacional dos profissionais de enfermagem, um estudo comparativo entre Portugal, Brasil e Espanha, está a estudar os contextos laborais dos profissionais de enfermagem e a saúde dos trabalhadores identificando níveis de stress, burnout, presentismo (estar presente no local de trabalho mas, por razões físicas ou psicológicas não produzir de acordo com o esperado), satisfação com o trabalho, compromisso, resiliência e inter-relação destas variáveis.

 

De carácter transfronteiriço e até transcontinental, visto envolver a Escola Superior de Enfermagem do Porto (ESEP), a Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação do Porto (FPCEUP), a Facultad de Medicina y Ciencias de la Salud (Enfermagem) da Universidade de Oviedo (UNIOVI), Espanha e a Escola de Enfermagem da Universidade de S. Paulo (USP), Brasil, esta investigação conta com docentes de cada escola e tem associados já 3 enfermeiros da prática clinica (Unidade de Saúde da Ilha de S. Miguel-Açores, USP Paredes-ACES Tâmega II - Vale do Sousa Sul e do INEM) com uma equipa regular de 9 pessoas, para além de estudantes de Doutoramento e de Mestrado.

 

Segundo a professora da ESEP, Elisabete Borges, “as situações de violência, mais particularmente, as de bullying, emergem como uma realidade nos contextos laborais, associando a comportamentos que potenciam a subvalorização do trabalho, qualidade/sobrecarga de trabalho e de intimidação. Para além de níveis significativos de stress e burnout que podem de algum modo reflectir o mito do trabalhador saudável, ou seja, só preencherem questionários os enfermeiros que ainda não estão em desgaste”.

 

Num dos estudos, que envolveu 474 enfermeiros de hospitais universitários centrais (52% de Oviedo e 48% do Porto), foram encontrados níveis baixos ou moderados de stress no trabalho provocado pela falta de suporte ou conflitos com enfermeiros. Já a sobrecarga do trabalho e dificuldade em lidar com a morte foram consideradas mais stressantes. A comparação entre países revelou poucas diferenças significativas, embora em Portugal tenham sido considerados mais stressantes os factores: falta de suporte e incerteza quanto aos tratamentos.

 

Resultados preliminares de um outro estudo sobre burnout, que englobou profissionais de enfermagem de Oviedo, Porto e Brasil, detectaram 56% dos enfermeiros com baixo burnout, 33% com grau moderado e 11% com nível elevado.

 

Relativamente ao compromisso e entrega, os 160 enfermeiros analisados, e que realizam funções nos cuidados de saúde primários na região do Porto e de uma das ilhas dos Açores, apresentaram elevados níveis de compromisso, sendo a dedicação a dimensão mais elevada.

 

Também foi identificada uma prevalência de bullying de 9,3%, numa amostra de 324 enfermeiros a exercer funções em Portugal. Num estudo comparativo com enfermeiros do continente e Açores houve diferenças significativas nos diferentes tipos de bullying, apresentando os enfermeiros com parceiro dos Açores maior percepção de actos negativos associados à exclusão. Os enfermeiros portugueses mostram ainda níveis moderados de presentismo e os enfermeiros espanhóis revelam ter níveis elevados, não existindo diferenças nos níveis de stress.

 

Elisabete Borges adiantou que o grupo de investigação procura “o desenvolvimento de um programa de prevenção e gestão do stress no trabalho com recurso a uma tecnologia informática que monitorize regularmente os enfermeiros, encontrando-nos a concorrer para obtenção de apoio financeiro à sua concretização”.

 

Sobre a valorização da enfermagem, a docente acredita que “nomeadamente a Enfermagem do Trabalho em Portugal tem vindo a ter uma maior visibilidade e reconhecimento, especialmente com o aumento de formação nesta área do conhecimento. Assim como pela Certificação da Competência Acrescida Diferenciada em Enfermagem do Trabalho, no âmbito do Exercício Profissional de Enfermagem, publicado em Junho deste ano, pela Ordem dos Enfermeiros (Diário da República, 2.ª série-N.º 114-15 de Junho de 2018).

 

Apesar de admitir que “ainda há um caminho a percorrer para que os enfermeiros sejam reconhecidos socialmente, de acordo com as competências que já possuem”, a professora da ESEP defende também que é “essencial a consciencialização por parte dos gestores da importância desta área do conhecimento para o trabalhador, organizações e sociedade. Pode-se melhorar a dotação dos serviços de recursos humanos e condições que valorizem e potenciem a implementação de estratégias de promoção de saúde, em que os trabalhadores sejam participantes activos”.

 

Enfermeira especialista em Enfermagem Comunitária, Elisabete Borges é na actualidade investigadora responsável do Projecto INT-SO, Professora Adjunta da Escola Superior de Enfermagem do Porto e investigadora do CINTESIS, tendo coordenado o livro “Enfermagem do Trabalho: Formação, Investigação e Estratégias de Intervenção”, o primeiro livro desta área de conhecimento em Portugal, publicado neste ano.

GCI/PR