"Gestão de Caso", o programa premiado da ULS do Litoral Alentejano

  • 29-04-2024

Num país com população envelhecida, com um Serviço Nacional de Saúde a tendencialmente olhar para a pessoa com doença crónica complexa de forma desfragmentada, em 2016 foram dados os primeiros passos para o programa Gestão de Caso na Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano (ULSLA), colocado em prática no ano seguinte. Os números comprovam o sucesso de um projeto que, recentemente, foi distinguido com o prémio Top Health Award, na categoria de Integração de Cuidados.


Hugo Mendonça, Enfermeiro gestor de caso da equipa de Gestão de Caso da ULSLA, fala com entusiasmo do programa que ajudou a criar e cuja a importância não pode ser medida apenas por números. Um dos grandes objetivos centra-se em dar melhor qualidade de vida aos doentes visados, garantindo o acesso que precisam, quando precisam, aos cuidados de saúde necessários no momento.


A distinção "foi extremamente importante para todos os profissionais que fazem parte da equipa", segundo Hugo Mendonça.


"O sistema ainda está muito desfragmentado, quer em cuidados diferenciados, quer em cuidados primários. A integração de cuidados é um processo de criação e manutenção de uma estrutura comum que vai ao encontro das necessidades das pessoas. Nós queríamos reorganizar, integrar serviços, centrar o que era essencial para atender as necessidades desta população específica", explica.


"A mudança da cultura organizacional é das coisas mais difíceis. Estamos habituados a trabalhar numa visão reativa, com resposta à doença aguda e não estamos ainda preparados para a pessoa com doença crónica e, principalmente com doença crónica complexa", acrescenta.


O Top Health Award é mais uma motivação para todoos que integram as equipas de Gestão de Caso de continuar a melhorar e criar serviços específicos para esta população-alvo. 

 

Como funciona e quais são os objetivos


Desde 2017 que 248 pessoas com doença crónica complexa foram abrangidas pelo programa, com 238 no ativo. Além deste fator, são ainda tidos em conta a multimorbilidade e polimedicados.


O sistema informático ajuda na identificação de potenciais casos, algo que acontece automaticamente quando alguém vai a um serviço de urgência quatro vezes num ano, por exemplo, com dois internamentos a também serem uma chamada de atenção.


"Os serviços ainda não estão adaptados e programados para um melhor atendimento a estas pessoas porque estão muito focados ou numa doença ou numa forma reativa à doença. Está centrado na doença e não devidamente em pessoas com várias doenças", salienta Hugo Mendonça.


O enfermeiro recorda como Portugal é o quarto país da OCDE com maior percentagem de população com mais de 65 anos, tendo uma elevada esperança de vida, mas com limitações para se manter um padrão de vida de qualidade. "Ou seja, temos uma população com enorme comorbilidade, vulnerabilidade, complexidade e fragilidade", afirma.


"Esta realidade tende a aumentar e os sistemas estão desfragmentados. A pessoa com doença crónica complexa é considerada utilizador frequente não só dos serviços de urgência, mas de todos os serviços de saúde. E os serviços ainda não estão preparados para atender as necessidades destas pessoas e das suas famílias", reforça.

 

Existem cinco equipas na ULSLA – divididas entre hospital e cuidados de saúde primários –, multidisciplinares, com o enfermeiro a assumir um papel central: é ele o gestor de caso.


Para Hugo Mendonça, tal faz todo o sentido dada formação do enfermeiro, "não só pelas suas competências, mas pela capacidade que tem de olhar para a pessoa e para os seus familiares num contexto centrado numa visão holística, garantindo a transição de cuidados".


Depois de identificado avaliado o caso, "é criado um plano de cuidados multidisciplinar em que o enfermeiro gestor de caso, sempre com a pessoa, garante que existem todos os recursos disponíveis na comunidade que vá atender às necessidades que foram identificadas. Não fica apenas pelo ponto de vista clínico, de medicina interna e familiar. É muito mais do que isso", explica.


Um dos objetivos desta metodologia passa por assegurar que o doente é responsável pelo seu plano de ação, sendo que tem de ter "capacitação na área da doença, na área da medicação, na área dos autocuidados, como viver com as várias doenças, ter confiança que em qualquer momento de descompensação é assegurado o melhor serviço e o melhor cuidado na hora certa."


"Esta é uma das principais funções do gestor de caso", diz o Enfermeiro Hugo Mendonça.

 

Os números de sucesso


Refere que as comorbilidades mais frequentes são as que têm maior incidência a nível nacional: insuficiência cardíaca, a doença renal crónica, a doença pulmonar obstrutiva crónica, a diabetes mellitus e fibrilação auricular.


E quanto aos números, os resultados de 2023 indicam:

 

  • redução de 57 a 61% das idas ao serviço de urgência do hospital;
  • redução de 60 a 65% de idas ao serviço de urgência básica dos centros de saúde;
  • redução de 52 a 60% dos internamentos e uma redução de 50 a 55% dos dias de internamento, além que a demora média das pessoas que são internadas diminuiu de 10,5 dias para 8,7 dias;
  • redução de 40 a 50% nas consultas de medicina geral e familiar;
  • aumento de cerca de 9% das consultas hospitalares.

 

Este aumento é prontamente justificado: "Estas pessoas necessitavam de ter estes cuidados mais diferenciados, portanto quando se solicita uma consulta imediata, aumenta-se o número de consultas."


Analisando os números, o Enfermeiro Hugo Mendonça não hesita em dizer: "Se olharmos para estes dados e fizermos uma reflexão, conseguimos perceber que é importante para o SNS esta diminuição de custo. Contudo, para a promoção e qualidade de vida da pessoa, que é o que nos interessa, o facto de em termos um menor risco de ida ao serviço de urgência, diminuição de internamentos, tal garante uma promoção de bem-estar e de qualidade de vida."

 

Fotografia principal: Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano