IX Seminário de Ética da Ordem dos Enfermeiros

Dia:  26-09-2008

Local: Grande Auditório da Faculdade de Ciências, Lisboa

«10 anos de Deontologia Profissional - 60 anos de Direitos Humanos» - Resumo alargado

O IX Seminário de Ética, uma iniciativa do Conselho Jurisdicional (CJ) da Ordem dos Enfermeiros (OE), decorreu, a 26 de Setembro, no Grande Auditório da Faculdade de Ciências de Lisboa. «10 Anos de Deontologia Profissional – 60 anos de Direitos Humanos» foi o tema central do evento que cativou o interesse de 448 enfermeiros e 94 estudantes de Enfermagem de todo o país.

 
Fotografia: Vera Vidigal 

 
O IX Seminário teve início com a mesa de abertura e com a alocução de honra, a cargo da Enf.ª Maria Augusta Sousa, Bastonária da OE. A Enf.ª Maria Augusta Sousa começou por relembrar que, há 10 anos, o Estado entregou aos enfermeiros portugueses a tarefa de regular a prática profissional. Sendo o Código Deontológico do Enfermeiro um documento que, por fazer parte integrante do Estatuto - e, por inerência, do Decreto-lei que criou a OE –, tem uma força de lei, a Enfermagem acaba por ter uma realidade que «não acontece com todas as profissões reguladas».

 
Fotografia: Vera Vidigal 
De acordo com a Bastonária, existe uma ligação directa entre a ética profissional e a defesa dos Direitos Humanos (DH). Neste sentido, o enfermeiro assume um papel essencial na defesa e respeito pela dignidade dos cidadãos e estabelece «antes de tudo, uma relação humana com o cidadão». Em cada acto praticado, o enfermeiro tem de respeitar os direitos da pessoa que tem ao seu cuidado.
Finda a alocução de honra, tomou a palavra o Prof. Silveira de Brito, docente de Filosofia da Universidade Católica Portuguesa (Braga).

O prelector em questão começou por afirmar que «o Serviço Nacional de Saúde depende em grande medida do trabalho dos enfermeiros», apresentando de seguida os conceitos de moral, ética e de deontologia.

Segundo o Prof. Silveira de Brito, «a moral é uma espécie de "colete-de-forças" constrangedor e o que distingue o ser humano é ele ser uma consciência moral». O ser humano vai-se construindo mediante as opções que toma e o poder de agir estabelece-se na altura em que este toma a decisão.
 
«O ser humano é intrinsecamente moral. É um ser que avalia o seu agir através das normas», referiu o académico, fazendo depois a distinção entre as teorias do agir e as teorias do fazer. Neste seguimento, a ética «é o saber normativo sobre o que deve ser» e a deontologia «é a teoria do fazer e do praticar, ou seja, formula os deveres e as obrigações» de um grupo profissional. Estabelece um conjunto de normas exigíveis a todos os que exercem a mesma profissão. De acordo com o orador, os códigos deontológicos são meros instrumentos e não um fim em si, na medida em que «os direitos humanos são o fundamento último dos códigos deontológicos».

A primeira mesa redonda do IX Seminário de Ética contou com as intervenções do Prof. Daniel Serrão, especialista em Bioética, da Enf.ª Maria José Silva, membro da Amnistia Internacional – Secção Portuguesa, da Enf.ª Teresa Oliveira Marçal, Vice-presidente do Conselho Directivo da OE, e do Enf.º José Cerqueira, Vogal do CJ.
 
Desta sessão destacamos a intervenção do Prof. Daniel Serrão que começou por separar três áreas: a ética operativa, a deontologia e os DH. Para o docente, «a ética é uma capacidade da inteligência» e é esta capacidade humana que permite actuar, tomar decisões após uma ponderação de valores. Mas o que são os valores? Segundo Daniel Serrão, «os valores nascem exclusivamente das percepções individuais» e é através da ponderação dessas percepções que se constroem imagens e se tomam decisões. «O Homem é um ser social e tem de se relacionar com os outros num universo ético. Somos um armazém de valores e trocamos valores». A isto, Daniel Serrão dá o nome de ética dialogal.   

Fotografia: Vera Vidigal 

No que diz respeito à deontologia, o docente afirma que esta se refere «a um determinado universo». É necessário estabelecer relações numa base de ética, ou seja, «atribuir eticidade a determinadas decisões». Para o especialista em Bioética, o código deontológico não passa de um «compromisso ético» e a norma deontológica é o resultado de um consenso.

Fazendo uma ligação aos DH, Daniel Serrão afirmou que «a Declaração Universal dos Direitos do Homem não tem valor jurídico, mas tem dignidade ética». Finalizando a sua intervenção referiu que o código deontológico dos médicos não tem força de lei (não faz parte dos Estatutos do Ordem dos Médicos), e por isso não está dependente de outras instituições para ser revisto. Ou seja, as normas têm força ética e não jurídica.

Fotografia: Vera Vidigal 

Ao tomar a palavra, a Enf.ª Maria José Rodrigues deu a conhecer à plateia de enfermeiros as várias campanhas realizadas pela Amnistia Internacional. Aos projectos já existentes, irá juntar-se em 2009 a campanha pela Dignidade Humana, que terá incidência em várias áreas da Saúde.

A representante da Amnistia Internacional em Portugal fez ainda referência às experiências levadas a cabo por empresas farmacêuticas em países do continente africano. De acordo com a prelectora, essas experiências têm resultado em mortes e em prol do desenvolvimento científico, a resposta frequentemente dada pelos países desenvolvidos para esta realidade é a seguinte: «Não há homicídios em África, apenas mortes lamentáveis, mas com benefícios para a civilização».

Na sua intervenção, a Enf.ª Oliveira Marçal referiu a importância de se reflectir a deontologia profissional em torno de dois eixos: um profissional e outro universal. Fazendo a ligação entre a deontologia profissional e o DH, a Vice-presidente do Conselho Directivo da OE destacou os valores e os princípios como pilares fundamentais dos DH, nomeadamente a dignidade humana, a equidade, a solidariedade e a participação. Referiu ainda que «a reforma da Saúde assenta nestes princípios» e que esta «deve ser feita com a intervenção de todos» os envolvidos na área da Saúde.

Destacando o trabalho da Ordem no que diz respeito à deontologia, a Enf.ª Oliveira Marçal referiu a importância das tomadas de posição e os pareceres emitidos pela OE, os quais «orientam o nosso agir» e «são directrizes que não podemos ignorar». Há 10 anos, o Estado entregou à Ordem os poderes para regulamentar a profissão. Nesta medida, e com o intuito de criar um processo mais transparente para os cidadãos, «temos tentado criar as condições para um Modelo de Desenvolvimento Profissional», o qual «vai ser relevante para a qualidade dos cuidados prestados».

O Enf.º José Cerqueira, Vogal do CJ, começou por dizer que há uma correspondência entre a Convenção Universal dos Direitos Humanos (1948) e o Decreto-Lei que instituiu a OE (1998), visto que ambos têm como princípio fundamental o respeito pela dignidade humana, o qual deve estar implícito em todas as decisões levadas a cabo pelos enfermeiros.

«A dignidade é própria de todos os seres humanos. Não se pode ter mais ou menos dignidade. Ser-se mais ou menos pessoa», afirmou o enfermeiro fazendo uma breve exposição dos artigos relacionados com a deontologia profissional. Terminou a sua intervenção relembrando que os enfermeiros são «gente que cuida de gente. Temos de cuidar bem de nós para cuidar bem dos outros».

Fotografia: Vera Vidigal 

Durante a tarde, o debate centrou-se à volta do tema «10 anos de Deontologia Profissional de Enfermagem». Depois de uma breve introdução a cargo do Enf. Sérgio Deodato, Presidente do Conselho Jurisdicional da OE, seguiu-se a intervenção da Enf.ª Lucília Nunes, Presidente do Conselho de Enfermagem da Ordem dos Enfermeiros e Presidente do Conselho Jurisdicional no 2º Mandato, sobre a fundamentação da deontologia profissional.
 
A anterior Presidente do CJ começou por fazer uma separação entre a fundamentação e a interpretação. Exemplificando, o código deontológico é um conjunto de normas e deveres, cuja formulação é algo abstracta. Cabe ao CJ fazer um trabalho de interpretação, ou seja, apreciar casos concretos e emitir pareceres, os quais se tornam linhas orientadoras para a boa prática.
Segundo Lucília Nunes, a deontologia «pressupõe uma teoria geral da acção humana» isto é, «toma como objecto o "a-fazer"». Envolve ainda «um código de direitos e deveres num contexto concreto de acção, uma reflexão crítica e dinâmica sobre esse código e um procedimento ético concreto num âmbito delimitado».

Passando à deontologia profissional, esta «visa disciplinar a actividade profissional», ou seja «garantir o bom exercício profissional» e alicerça-se em «princípios éticos e na sua própria regulamentação». A deontologia profissional «é construída a partir do interior da profissão», na medida em que é «resultante duma reflexão própria sobre a prática».

No caso da Enfermagem, esta tem «uma finalidade moral» que passa pelo «bem-estar de outros cidadãos» e onde o princípio da dignidade humana é um princípio ético. Neste âmbito, o cuidado humano surge «como imperativo moral das profissões de Saúde», onde os enfermeiros têm uma responsabilidade perante a sociedade, a qual se transmite num compromisso profissional de cuidado.
O IX Seminário terminou com a apresentação das conclusões e com a sessão de encerramento, presidida pela Enf.ª Maria Augusta Sousa, Bastonária da OE.

Das conclusões apresentadas, a Enf.ª Teresa Carneiro, Vogal do CJ, salientou que tanto a prática de Enfermagem como a defesa dos DH se centram nos cuidados ao «Outro». Há uma relação de cuidado, na qual o enfermeiro se responsabiliza pela defesa do cidadão e pelos seus direitos. Assegurando a qualidade dos cuidados de saúde, a OE assume essa responsabilidade, na medida em que os enfermeiros têm como dever «proteger e defender a pessoa humana».

Conforme referiu na mesa de abertura o Enf. Sérgio Deodato, Presidente do CJ da OE, o tema da edição deste ano do seminário visou fazer «uma reflexão sobre a deontologia de Enfermagem e a sua fundamentação ética nos Direitos Humanos», atendendo às duas efemérides que se assinalam em 2008. A imagem escolhida para este ano – uma espiral – transmite bem essa mensagem. A espiral inicia-se no centro e vai-se desenvolvendo, tal como o trabalho realizado pela Ordem relativamente à deontologia e aos direitos: um trabalho de aprofundamento onde a reflexão é palavra-chave para o desenvolvimento.

IX Seminário de Ética - 26 de Setembro - Grande Auditório da Faculdade de Ciências de Lisboa - Bloco C3 - Campo Grande
 
«10 anos de Deontologia Profissional - 60 anos de Direitos Humanos» é o tema que irá presidir a mais uma edição do Seminário de Ética, uma iniciativa do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros que se realizará a 26 de Setembro.

As inscrições encontram-se encerradas.

Ofício enviado aos membros

Lista de Inscritos

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