«Portugal deve investir em Enfermagem, se quiser ter melhores indicadores de saúde e imprimir maior rentabilidade ao Sistema», defendeu o Enf. Germano Couto, nos «Jantares com Ordem», no Casino da Figueira da Foz

«Portugal deve investir em Enfermagem, se quiser ter melhores indicadores de saúde e imprimir maior rentabilidade ao Sistema», defendeu o Enf. Germano Couto, nos «Jantares com Ordem», no Casino da Figueira da Foz

 

No passado dia 15 de março, o Bastonário da Ordem dos Enfermeiros (OE), Enf. Germano Couto, foi o convidado dos «Jantares com Ordem», uma iniciativa do Casino da Figueira da Foz, que tem atraído ao local diversos representantes máximos das Ordens profissionais.

Num debate informal com a plateia, o Enf. Germano Couto deixou claro que «Portugal deve investir em Enfermagem, se quiser ter melhores indicadores de saúde e imprimir maior rentabilidade ao Sistema». Embora Portugal tenha hoje um dos melhores Sistemas de Saúde do mundo, é também dos mais caros, abundam as ineficiências e era possível gastar menos com a mesma qualidade, defendeu o orador.

E embora considere que a profissão «não tem sido devidamente valorizada, sobretudo pelos agentes políticos», o Bastonário da OE acredita que com o atual Ministério da Saúde «pode haver uma luz ao fundo do túnel» capaz de inverter essa situação, permitindo diminuir o desperdício no setor da Saúde, que ronda os 25 por cento.

Neste momento, o cenário é tudo menos animador: a usurpação de funções por outros profissionais, aliada ao desemprego e à emigração, à precaridade laboral e à falta de reconhecimento salarial (com enfermeiros pagos muitas vezes a dois ou três euros à hora), são alguns dos principais problemas que atingem a classe. É, no entanto, em situações de «desalento, de crise, de desmotivação» que surgem as melhores oportunidades para dar a volta à situação, aludiu o responsável.

O Enf. Germano Couto voltou a insistir que Portugal está a investir milhões na formação de enfermeiros e está a deixá-los emigrar «a custo zero». Deu como exemplo o que sucede em Inglaterra que está atualmente a encerrar Escolas de Enfermagem «porque já percebeu que Portugal forma enfermeiros gratuitamente e exporta-os de braços abertos», detendo estes uma qualidade de formação considerada das mais sólidas do mundo e um exemplo para muitos países.

Paradoxalmente assiste-se no país à falta de enfermeiros nos hospitais e centros de saúde, de acordo com estudos levados a cabo por organismos do Estado. O dirigente da OE recuperou um estudo da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), relativo a 2009, mas divulgado em abril de 2011, junto de 55 hospitais, e na altura faltavam 3.117 enfermeiros nestas unidades hospitalares. «Isto significa que há milhares de horas de cuidados de Enfermagem que não são prestadas, há muitas horas de suporte emocional, de comunicação e de ensino que ficam por ministrar – o que dará origem a maiores taxas de reinternamento dos doentes, o que será uma opção mais dispendiosa do que investir na contratação de enfermeiros», adiantou o Bastonário.

Enfermeiros não querem substituir médicos

O Enf. Germano Couto fez questão de deixar claro que os enfermeiros não se querem substituir aos médicos. Falou da complementaridade das duas profissões e das «zonas cinzentas», como lhe chamou, embora considere que há competências dos enfermeiros que estão subaproveitadas. Deu como exemplo o que sucede com os enfermeiros especialistas em Saúde Materna e Obstétrica que já podem realizar o seguimento normal de uma gravidez de baixo risco mas não têm autonomia para prescrever ecografias ou solicitar análises, o que origina desigualdade no acesso. Lembrou que quase 1.500 cidadãos já pediram à Assembleia da República, através de uma petição, para reverter esta situação.

Nos dias de hoje, os enfermeiros já prescrevem cuidados de Enfermagem, ajudas técnicas e fármacos de venda livre, aludiu o responsável. Mas poderiam fazer muito mais, nomeadamente em termos de seguimento de doentes crónicos, onde está provado «que existiria maior satisfação dos utentes». O sistema de saúde está muito «centrado no médico e pouco no cidadão», enfatizou o Bastonário, que acredita que se houvesse um ensino mais aprofundado da gestão terapêutica, haveria menos erros associados à administração dos medicamentos da parte dos idosos.

Enfermeiros especialistas subaproveitados por razões «económico-financeiras»

O orador convidado do Casino da Figueira da Foz referiu ainda que, por razões «económico-financeiras», a maior parte dos enfermeiros especialistas está exercer cuidados gerais e não é contratada para funções mais diferenciadas, sendo que «os mais penalizados são os cidadãos que não obtêm os cuidados especializados de que necessitam». Há também o risco dos enfermeiros especialistas, com o passar dos anos, por não exercerem a especialidade, perderem as competências que possuíam.

O Enf. Germano Couto traçou um panorama da evolução da história da OE, lembrando que a instituição está prestes a completar 14 anos de existência, «é ainda uma Ordem muito jovem», mas muito antes disso já germinava na mente dos enfermeiros. No ano da sua criação, em 1998, começou por ter 35 mil membros inscritos; hoje, são mais de 64.500, sendo que 11.622 são enfermeiros especialistas - «um número ainda insuficiente face àquilo que são as necessidades da população».

E se nos primórdios, as preocupações da instituição estavam relacionadas com a organização interna da estrutura, com a criação de padrões de qualidade e com as condições de exercício profissional; nos dias de hoje, têm que ver com a descapitalização humana das unidades de saúde, com a ausência de regulamentação do «Exercício Profissional Tutelado» e com a necessidade de dotações seguras nos serviços.

O Bastonário traçou também um perfil da classe: «A maioria dos enfermeiros é do sexo feminino (81%), tem entre 21 e 35 anos, exerce nos grandes centros urbanos e maioritariamente em hospitais».

Ana Saianda